segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Vá para fora...

Olá Doutor, posso?

Doutor? Está a ouvir-me?

Ah, pronto! Está com um ar abatido. Não teve férias? Então, se teve, está assim porquê? Não me diga que é mais uma daquelas pessoas que deixa que as saudades o impeçam de valorizar o que já teve e, sobretudo, o que hoje tem...

Sim, as férias passaram, ficaram as fotos de toda a gente em biquíni ou calções e com um bronze de fazer inveja, das paisagens e dos sorrisos de praia... O que se pode querer mais? Para os fãs das redes sociais é o expoente máximo, a oportunidade ideal para ter a "tal" foto, tirada com o bichinho secreto que "tal" ou "tais" pessoas vejam. Enfim, não publiquei as fotos, mas posso garantir-lhe que a minha estreia numas férias quase, quase, quase a sério foi excelente e, sim, já regressei ao trabalho, pronta para mais uma temporada de rotinas e descobertas.

Sabe, sinto-me ligeiramente irritada quando ouço as pessoas a falarem das férias com um ar nostálgico. O tempo em que puderam usufruir de tempo livre para fazer milhentas coisas, umas mais convencionais e baratas do que outras, é um luxo de que devem orgulhar-se. Mas não, falam como se o mundo terminasse com o fim do Verão...

Meu caro Doutor, em primeiro lugar, ter férias é sinal de que se trabalha e, por fim, nem todos se podem dar ao luxo de ir para fora cá dentro ou simplesmente ir para fora, mesmo lá fora.

Sabe, mais uma vez, não dei ouvidos ao apelo da Presidência (sim, sou uma rebelde... já não bastava recusar-me a dar o meu contributo para a taxa de natalidade e agora isto...) e optei por meter os pezinhos do lado de lá da fronteira, ou melhor, os pés e as rodas do "coche". Não me sinto nostálgica, antes pelo contrário, fico feliz por ter novas memórias de momentos, pessoas e lugares, por não deixar que o bichinho de querer mais se acomode e, sobretudo, por ter tido a oportunidade de partir sem me deixar limitar pela sensação de ter os tostões completamente contados. Fui e pronto!

Começo a aceitar que a vida mudou, de facto, mas questiono-me até que ponto a mudança não terá ocorrido interiormente. Fui eu quem foi para fora, dentro... de mim mesma. É certo que os tostões não são os mesmos, que os gastos são outros, mas sinto-me bem, sinto-me mais leve e recuso-me a desperdiçar tempo com o nó no estômago devido às contas para pagar. Desde que as principais estejam garantidas, resta definir prioridades e as minhas já não passam por pagar balúrdios pelos simples prazeres da vida. Sim, posso manter o requinte e pagar muito menos por isso!

Deixei para trás uma cidade inteira, apinhada de desconhecidos e uma minoria de pessoas que adoro. No entanto, posso pensar nessa experiência como mais umas férias com amigos que posso visitar regularmente e a quem levarei um sorriso em vez de queixas sobre o meu dia a dia. Ai, Doutor, a força de um sorriso é fantástica, sobretudo quando o partilhamos. É uma dádiva que se dá e recebe sem esforço, sem contrapartidas.

As viagens mais interessantes são aquelas que fazemos ao nosso interior. As férias potenciam a descoberta, mas o quotidiano tem sempre uma ou outra surpresa reservada e tudo acaba por fluir e encaixar.

Não, o mundo não acabará no fim do ano! Ele continuará a girar, independentemente do que lhe fizermos. Resta saber se aprenderemos a tempo que as coisas mais belas são as mais simples e, admire-se, em muitos dos casos... gratuitas!